quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Imprensa: uma análise historiográfica das eleições de 1989

Cristiano Guerra Leal

O presente artigo intitulado "Imprensa: uma análise historiográfica das eleições de 1989 aborda a questão referente às eleições do ano de 1989, precisamente, o embate entre os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello, e como foi conduzido  o debate organizado pela Rede Globo. Realizaremos então uma discussão historiográfica sobre o papel da mídia neste processo de suma importância na história brasileira.

A escolha para o presidente da República era muito aguardada pela população brasileira no ano de 1989, pois isso não ocorria há 29 anos. Com as atuais circunstâncias, os candidatos que se destacaram na primeira fase das eleições, eram aqueles que conseguiam mexer com a emoção popular, eram eles: Leonel Brizola, Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello.

Brizola, que havia sido cassado pelo golpe de 1964, voltou ao Brasil e conseguiu se eleger governador do Rio de Janeiro. Tinha um forte apelo em amplos setores do eleitorado, com sua luta contra os "inimigos da pátria". Porém, logo foi passado por Fernando Collor de Mello, político jovem, que vinha de uma família ligada a política, neto de Lindolfo Collor, político que organizou a legislação trabalhista no começo do Governo Vargas; e filho de Arnon de Mello, deputado alagoano. De discurso inflamado, se proclamava um herói solitário, que lutava contra a corrupção, representada na figura dos Marajás. Notamos que esse discurso foi reforçado em uma das capas da revista Veja, como podemos ver abaixo:

Imagem 1. Capa da Revista Veja, Edição de 1989

O discurso de Collor ganhava o apoio da mídia, já que ele oferecia a solução para a população brasileira, que era um homem de pulso firme para acabar de vez com a corrupção e a inflação que assolava os brasileiros.

Sua campanha recebeu apoio de setores econômicos e sociais, pois estes tinham receio de que a disputa poderia ser realizada somente com políticos de esquerda, a campanha 'collorida' foi muito agressiva. Principalmente com os ataques realizados ao governo Sarney e aos seus concorrentes mais próximos. O 'Caçador de Marajás' mostrava suas armas e seus métodos iam surtindo efeito.  A aliança de todos esses aspectos fez com que o governador de Alagoas liderasse as pesquisas e se garantisse no segundo turno. Podemos ver na imagem abaixo, a força de marketing que o partido de Collor possuía.


Imagem 2. Imagem que retrata a mudança do logotipo de Collor de quando concorreu para governador e posteriormente para presidente



Lula, com sua história pessoal de pobreza que se confundia com a maioria do povo, corria por fora que nessa disputa teve uma arrancada, conseguindo superar Leonel Brizola. Assim, definia-se a disputa do segundo turno, com Fernando Collor, o 'fenômeno das Alagoas' e Luiz Inácio, o 'líder operário' do ABC paulista.

Collor, através de sua experiência com os meios de comunicação, foi conquistando e tendo acesso ao imaginário político nacional. Seu modo de falar e de agir frente às câmeras, proporcionava a ele prestígio, como podemos comprovar nesta imagem recortada de um vídeo na sua apresentação no debate do segundo turno, transmitido pelas emissoras de TV de destaque na época: Bandeirantes, Manchete, SBT e Globo:


Imagem 3. Imagem recortada do vídeo do Debate realizado entre Collor e Lula em 1989



Percebemos que Collor utiliza de uma técnica de autopromoção voltada para captura da atenção das câmeras de televisão. Acessando o link e vendo o vídeo, iremos perceber que enquanto Lula já tentava mostrar suas idéias ao público brasileiro em sua apresentação, Collor fazia uma saudação cordial, referindo-se até a uma data significativa para a população brasileira, o Natal. Mencionando ainda o nascimento do principal personagem da religião católica.



Imagem 4. Imagem recortada do vídeo da Rede Povo

Collor também se refere, em sua visão, também a linha que Lula baseia suas idéias, na corrente marxista, utilizando deste ponto para dizer que o seu adversário iria contra os princípios democráticos que a população brasileira procurava.

Esse debate que estamos utilizando para esta análise, mostra também vários processos de edições, assim alterando algumas falas do candidato Lula nele mostradas, como por exemplo, aos 6 minutos e 13 segundos, após a pergunta do jornalista Joelmir Betting, que referia-se a proposta de governo  para a dívida pública e o dinheiro do povo em bancos, Collor se diz contra os calotes e logo em seguida sua fala é cortada para Lula, que realiza um discurso confuso, que não teria algo haver com a pergunta feita. 

Ao buscar mais materiais para análise, um vídeo interessante realizado pela Rede Povo, mostrando certos fatos que comprovam que essa edição foi utilizada, no intuito de ‘prejudicar’ o candidato Luiz Inácio Lula da Silva. Logo em seu começo, o vídeo mostra Collor fazendo uma aparição no ano de 1987 em um programa que comemorava os 70 anos de aniversário do apresentador Chacrinha, onde ainda exercia seu mandato de governador em Alagoas. Desde então, suas aparições na televisão eram mais freqüentes.



Imagem 5. Imagem recortada do vídeo da Rede Povo



Isso nos remete a pensar que Fernando Collor já poderia ter um bom relacionamento com os meios de comunicação de destaque naquela época e que já poderia estar estudando suas estratégias para a campanha presidencial. Seguindo ao longo do vídeo, podemos ver um relato de um jornalista que supervisionou em sua edição, no debate das eleições de 1989, chamado Vianey Pinheiro. Claramente o jornalista diz que duas pessoas alteraram na essência o resumo do debate, e que isto virou uma peça publicitária.

Outros jornalistas também fizeram comentários sobre as edições realizadas no conteúdo da Rede Globo de televisão, um deles, Armando Nogueira, relatou que no dia seguinte ao compacto do debate, que não havia assistido o material e que se tivesse visto, teria impedido que fosse ao ar, e  teria dito que a Rede Globo havia sido infeliz e burra.


Imagem 6. Imagem recortada do vídeo da Rede Povo


Através deste material estudado, descobrimos outra versão para a história das eleições de 1989, que muitas vezes não são contadas em salas de aula. E a intenção deste artigo é mostrar como se pode ser trabalho este tema, com linguagens diferenciadas, explorando assim as diversas fontes para a pesquisa, renovando assim o ensino de História, como podemos ver na fala de Cooper:

fazer inferências sobre as fontes, sobre quem as fez, porquê, como podem ter sido utilizadas e como afectaram a vida quotidiana do passado, pode levar o historiador a considerar como é que estas pessoas pensavam e o que sentiam. Desenvolver esta imaginação histórica, formulando uma vasta variedade de suposições, é fundamental para se interpretar o passado.

Assim, iremos proporcionar aos alunos as diversas informações existentes de um fato, não correndo o risco de praticarmos uma história em que somente se evoca um lado, excluindo os agentes sociais envolvidos nela. E isto surgiu a partir dos novos conceitos da historiografia

O crescimento e as novas tendências da historiografia, no decorrer dos anos de 1970 e 1980, proporcionavam novos caminhos para o ensino e ampliava-se o debate sobre os paradigmas que deveriam fundamentar as novas propostas curriculares, incluindo nas discussões as possibilidades de inclusão das experiências das práticas profissionais nas escolas como forma de subsídio para as reformulações da História escolar (Silva, 1984; Fenelon, 1983).

Com estas novas tendências, se percebe a importância da ampliação de instrumentos para o ensino, como neste artigo, utilizamos vídeos postados no site Youtube, que são as novas tecnologias. Isso gera um aumento de informações para que enriqueça o debate, através de uma metodologia diferente de ensino, mostrando assim as outras versões existentes da história e gerando a possibilidade dos alunos conhecerem e se interessarem pelo conteúdo histórico.

Reafirmamos então que esta eleição de 1989 foi um marco para a histórica política do Brasil, onde acontece uma aproximação intensa com a mídia, como podemos comprovar

Sem dúvida, a eleição presidencial de 1989, realizada depois de 29 anos sem eleições diretas para presidente, aparece como acontecimento detonador de um boom imediato e posterior de reflexões sobre o enlace mídia e política. Pode-se afirmar que este acontecimento eleitoral, ao fazer emergir em toda sua potência estas novas conexões entre mídia e política, começa verdadeiramente a conformar um campo de estudos sobre comunicação e política no país, perpassado por olhares sintonizados com esta nova circunstância de sociabilidade acentuadamente midiatizada. 

A partir desse acontecimento a mídia se torna parte integral dos processos eleitorais, já que muitos brasileiros esperam os debates entre os candidatos para poder escolher o melhor político para o país, e muitas vezes, estes podem ser influenciados a votarem nos políticos que os meios de comunicação desejam eleger.

Referências bibliográficas

ALBINO, Antonio Canelas Rubim; ANTÔNIO, Fernando Azevedo. Mídia e Política no Brasil: Estudos e perspectivas. IV Congresso Latino americano de Ciências de la comunicácion, 1998.

BITTENCOURT, Circe Fernandes. Abordagens Históricas Sobre a História Escolar. Educação e Realidade, Porto Alegre, v. 36, n.1, p. 83-104, jan./abr., 2011.

COOPER, H. O pensamento histórico das crianças. In: BARCA, I. (Org.). Para uma
educação histórica de qualidade. Actas das IV Jornadas Internacionais de Educação
Histórica. Universidade do Minho, 2004. p. 55-76.

LATTMAN, Fernando. Como fazer um Presidente. Revista de História da Biblioteca Nacional São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

* Artigo produzido para a disciplina de Prática de Ensino em História, sob a orientação, da professora Ana Eugênia Nunes de Andrade.